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ADC 81: voto de vista rejeita embargos e reafirma limites da decisão.

  • Foto do escritor: Edgar Gaston Jacobs Flores Filho
    Edgar Gaston Jacobs Flores Filho
  • 20 de jun.
  • 7 min de leitura

Após pedido de vista, o Min. Dias Toffoli abriu a sessão designada para o período de 20 a 30 de junho de 2025, proferindo voto nos três embargos de declaração apresentados na ADC nº 81. Demonstrando atenção ao tema, acompanhou o Relator em diversos pontos de interesse do MEC, mas propõe uma mudança importante para o julgamento: a rejeição integral dos embargos, inclusive o dos autores, por ausência das hipóteses legais de oposição.


Os recursos foram desmembrados em três, de acordo com os respectivos proponentes, e analisados pelo Relator em março de 2025. Os embargos apresentados pelos amici curiae e por uma empresa interessada em questão específica não foram conhecidos. Já o recurso dos autores da ação foi parcialmente provido, unicamente para “acrescer fundamentação” favorável à Portaria MEC nº 531/2023. O Min. Flávio Dino acompanhou integralmente esse voto, inclusive quanto aos fundamentos adicionais.


Esse acréscimo — como já discutido em artigo anterior — constitui um obiter dictum, ou seja, uma consideração lateral, sem força vinculante e que não integra a razão de decidir. Ainda assim, o acolhimento parcial poderia transmitir a impressão de que haveria omissão a ser suprida, o que tornava juridicamente controvertido o conhecimento dos embargos.


O voto do Min. Toffoli ajuda a desfazer essa ambiguidade. Ao propor a rejeição de todos os recursos, sem prejuízo da fundamentação adicional trazida pelo Relator, reforça a ideia de que tais observações são opinativas. Não suprem lacunas do acórdão, não passam a integrar suas razões e, por isso mesmo, não têm o condão de validar, ainda que indiretamente, exigências infralegais de legalidade duvidosa.


O novo voto reafirma o entendimento do Relator.

O ponto jurídico central está precisamente nos fundamentos que sustentam a rejeição dos recursos. Tanto o voto do Relator quanto o do Ministro revisor afastam, expressamente, qualquer análise da legalidade da Portaria MEC nº 531/2023, por considerá-la fora do objeto dos embargos e alheia ao alcance da ADC nº 81.

“Não há que se falar em omissão do acórdão, sendo certo que o exame da legalidade da Portaria MEC/SERES n. 531/2023 extrapola o próprio objeto da presente ação declaratória de constitucionalidade.” (Voto do Relator)
“…a fim de regulamentar as análises técnicas a serem feitas nos procedimentos instaurados, o Ministério da Educação editou a Portaria 531/2023, que não se encontra abarcada pelo objeto das presentes ações, o que afasta a sindicabilidade da regulamentação vigente, quanto mais em sede de embargos de declaração (…). Portanto, com razão o ilustre Ministro Relator.” (Voto do Min. Dias Toffoli)

Com isso, já são três votos alinhados — do Relator, do Min. Flávio Dino e do Min. Dias Toffoli — no sentido de que o STF não apreciou nem validou a Portaria MEC nº 531/2023, ao contrário do que sustenta o MEC em diversos processos judiciais. É nesse sentido que a negativa de conhecimento aos embargos no novo voto somente reforça que os novos fundamentos inseridos não possuem força decisória.


Sobre os acréscimos à ADC e os riscos de interpretação.

Para esclarecer seu voto e demonstrar alinhamento com os argumentos do MEC, o Relator acrescentou considerações que não se limitam ao controle abstrato de constitucionalidade, tratando de temas que envolvem a aplicação concreta de normas infraconstitucionais e elementos fáticos.


O Min. Dias Toffoli acompanhou esses acréscimos, especialmente aqueles “referentes aos critérios de região de saúde e concentração de médico por habitantes”.


Esses fundamentos, no entanto, envolvem controvérsias que exigem análise específica de fatos e de conflitos entre normas infraconstitucionais.


A restrição territorial, por exemplo, foi justificada com base em Nota Técnica preparatória, qualificada como minuta, que sugeria dois critérios distintos — região de saúde e município. No entanto, essa proposta não foi incorporada ao texto final da Portaria. O normativo menciona apenas o município como base de análise, contrariando diretamente o que determina o art. 3º da Lei nº 12.871/2013.


Mesmo que se admitisse a coexistência de dois critérios — um principal e outro auxiliar —, a presença de um parâmetro manifestamente ilegal já exigiria ressalva expressa. A convivência com outro supostamente válido não convalida o vício. O silêncio institucional diante dessa contradição acaba por legitimar uma irregularidade que compromete a execução da política pública e evidência o risco de se tratar, no âmbito constitucional, questões que dependem da solução prévia de conflitos entre normas infraconstitucionais.


Outro ponto controverso é o teto de 60 vagas, citado como parâmetro legítimo. Esse número foi originalmente previsto no Edital MEC nº 01/2023 como patamar mínimo de viabilidade econômica. Sua conversão em limite máximo para os processos abrangidos pela ADC nº 81 negligencia o planejamento institucional e desvirtua a lógica original das avaliações in loco conduzidas pelo INEP, cujo propósito era verificar concretamente o potencial de oferta de cada instituição.


Em relação às vagas, trata-se de uma matéria essencialmente fática, que deveria ter sido definida sob contraditório e no âmbito dos processos ordinários. Não por acaso, as visitas in loco não foram consideradas — afinal, como ponderá-las individualmente no contexto de uma ADC? E sem contato direto com os indeferimentos, na prática, o voto do Relator acabou por “deixar de lado” o limite mínimo de 40 vagas — critério eliminatório, de impacto significativo, que não possui conexão clara nem justificativa técnica vinculada ao Edital citado.


Por fim, mesmo que esses vícios normativos não fossem suficientes — ou não se relacionassem diretamente com o objeto da ADC nº 81 —, o próprio acórdão determinou a análise individualizada dos processos administrativos. O uso de critérios genéricos, tanto para a aferição da necessidade social quanto para a fixação de número de vagas, contraria frontalmente essa diretriz.


À luz desse quadro, é preciso reconhecer que as falhas identificadas decorrem da própria limitação do controle abstrato, que impede a análise concreta de fatos e de normas infralegais. Por isso, ainda que os votos sejam tecnicamente consistentes, não puderam abranger todas as distorções práticas envolvidas. Os acréscimos feitos, portanto, devem ser lidos com as devidas ressalvas — que, aliás, são expressa e reiteradamente indicadas no próprio voto do Relator.


Questão prejudicial e retroatividade da norma.

Também é necessário enfrentar, neste caso, uma questão prejudicial de ordem lógica e jurídica: a possível retroatividade da Portaria MEC nº 531/2023.


Segundo jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal (RE 1.524.806 AgR; ARE 748.371; AI 741.038 AgR; ARE 936.459 AgR; e RE 955.845 ED, entre outros), não cabe à Corte examinar diretamente a retroatividade de normas infralegais, nem avaliar sua aplicação concreta. Tais questões exigem prévia análise da legislação infraconstitucional, de competência das instâncias ordinárias, especialmente quando envolvem possíveis violações a atos jurídicos perfeitos ou situações consolidadas — protegidas pelo princípio do tempus regit actum, pela segurança jurídica e pelo art. 6º da LINDB.


No caso, o próprio voto do Relator acolhe a alegação apresentada pela União de que, se aplicado o critério de densidade médica com base na média da OCDE, “praticamente todos os pedidos atenderiam ao parâmetro pretendido”. Com isso, reconhece-se que o novo critério foi escolhido justamente para limitar retroativamente os efeitos da decisão cautelar, tornando ineficaz a exigência de aferição concreta da necessidade social.


Essa conduta, expressamente confessada pela União, causa perplexidade ao revelar a adoção de uma regra frontalmente contrária à Lei nº 12.871/2013 e aos seus objetivos fundamentais de indução territorial, distribuição de cursos e ampliação do acesso com base em necessidades sociais efetivas. Mais relevante, contudo, é o fato de que o critério foi formulado a posteriori para restringir pedidos já conhecidos — configurando, no mínimo, uma tentativa de “mudar as regras do jogo” após o início do processo regulatório.

Diante disso, mesmo sem extrapolar sua própria competência constitucional, o Supremo Tribunal Federal poderia — e deveria — reconhecer que os indícios de retroatividade são suficientes para afastar qualquer presunção de compatibilidade entre os critérios da Portaria nº 531/2023 e os limites fixados na decisão da ADC nº 81.


Alerta institucional necessário.

A necessidade de “acrescentar fundamentação” evidencia que os embargos suscitaram questões juridicamente relevantes, ainda que fora das hipóteses legais previstas no art. 1.022 do CPC. Esses acréscimos, contudo, não tratam da constitucionalidade do chamamento público e, por isso, não integram a ratio decidendi da ADC nº 81. Trata-se de obiter dicta, cujos aspectos de legalidade — inclusive no que diz respeito à Portaria nº 531/2023 e aos seus critérios restritivos — permanecem sob a competência das instâncias ordinárias, como já reconhecido no próprio voto do Relator.


É justamente nesse ponto que se impõe um alerta institucional. Embora os votos reconheçam que tais matérias escapam ao objeto da ADC nº 81, ao inserir considerações laterais sobre a atuação e as normas do MEC, o STF corre o risco de influenciar e criar um viés nas decisões nas instâncias inferiores.


Por isso, o voto do Min. Dias Toffoli representa uma inflexão importante: ao reafirmar que não há omissão e que os embargos não devem ser conhecidos, reforça que os fundamentos adicionais não integram a decisão da Corte.


Esse esclarecimento, embora discreto, é essencial para prevenir distorções interpretativas e preservar os limites do acórdão modulador. Afinal, o que não foi decidido não pode ser tratado como se o tivesse sido — sobretudo em matéria de controle judicial sobre atos administrativos, cuja legalidade deve ser analisada caso a caso.


Jacobs Monteiro

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